24.3.07

Poema


Perdoem


Perdoem meus excessos
Pobres mortais.
Perdoem o peso que sai da minha boca
Se não, não sou eu mais.

Perdoem o meu olhar indiscreto
Minha incoveniência satírica
Minha forma de caminhar
Minha ação empírica.

Perdoem as minhas aspirações
Meu ouvir diferente
Minha introspecção que insiste
Meu desejo indecente.

Perdoem também a vida
Que é uma guerra
Onde a vida é difícil vingar
Caminhem com suas próprias pernas
Mas não se esqueçam de me perdoar.

Fragmentos


Tenho uma ligeira queda pelos fragmentos, eles nos estimulam a pensar a buscar o sentido, tira o cérebro da atrofia. Prefiro isso aos discursos prontos, mastigados que nos dizem de onde vêm e para onde vai.
O fragmento impõe mais que qualquer outra coisa a resignificação e o faz deixando claro que está fazendo.
É um bate papo, não um discurso.

9.3.07

Fragmentos


Não há filosofia sem vida. Não consigo suportar a idéia separada da existência, e uma parcela da tradição busca na segregação (vida e idéia / experiência e razão) o caminho para o conhecimento.
Busca-se uma razão pura. Pura de que? Do homem? Da vida real?
Por isso digo que só há pensamento justamente pelo fato da existência. Sem ela não há possibilidades, potência...Primeiro existo, depois penso. Essa é máxima existencial, assim inverte-se a máxima cartesiana: “Penso, logo existo”.
O pensamento pode e constata a existência, mas só penso por causa de minha existência, ela antecede a qualquer outra questão. Não se pensa sem existir.
Dessa forma, o pensamento está indissoluvelmente ligado à vida concreta. Sou as minhas experiências e meus pensamentos surgem daí.
Prefiro a vida. A questão não é a verdade, o conceito de verdade, mas o que se faz com ela.

27.2.07

Em-Tempo


Desfiles de escolas de samba como estamos vendo, com notas, critérios rígidos, tempo, celebridades, dinheiro, hierarquia...
Pode ser qualquer coisa, menos carnaval.
O carnaval é justamente a quebra de hierarquia, onde todos são iguais e qualquer um pode ser tudo sem chamar a atenção dos valores tradicionais. Poderia mesmo dizer que é uma festa dionisíaca.
Mas depois que criaram uma tal de liga, direito de imagem, sambódromo (lugar onde o samba corre), notas...e em decorrência comentários como: “essa é a melhor” ou “aquela foi a pior, por isso foi rebaixada”.
Ou seja, isso virou competição, virou ritual apolíneo. Virou também espetáculo onde uns são ativos e outros espectadores (passivos). Pois é, no carnaval todos são ativos e nunca espectadores, todos são protagonistas...
Carnaval não é razão, tudo menos isso... O povo não é bobo, e mesmo de forma inconsciente vem revitalizando os blocos.
Aos burocratas da razão, a burocracia. Ao carnaval, a festa...

Outros Pensadores


"Nada que é humano me causa entranheza"

Karl Marx

21.2.07

Em-Tempo


Sobre a violência:
Estamos todos no mesmo barco e deveríamos achar isso.

Contribuiriam mais para amenizar o problema da violência, se os meios de comunicação colocassem o debate em seu devido eixo ao invés de fazerem uso dos incidentes bárbaros para difundirem suas idéias pré-definidas.

Quando duas pessoas passam a viverem em sociedade, passam a estabelecerem regras de convivência para tornarem a vida possível. O que fazem as partes cumprirem o acordo é o fato de acreditarem coletivamente no mesmo projeto e se sentirem pertencentes e responsáveis por ele.

Quando uma das partes perde esse sentido, as regras passam também a não terem nenhum valor. Conseqüência: Quem não acredita mais na sociedade passa a descumprir as regras, pois sabemos que cumpri-las exige acreditar em algo maior que a tentadora vontade de não cumpri-la.

Quando pego um dinheiro emprestado com um amigo, por exemplo, posso ficar tentado a não pagar, pois é mais vantajoso para mim. Porém pago o dinheiro pelo fato de continuar a desfrutar da confiança que me faz pegar dinheiro emprestado novamente se precisar de novo. Se não pago, posso levar um não. Ou seja, troco a vantagem concreta por um valor que compartilho com meu amigo, um bem maior.

A grande lição é: Para cumprir uma norma, preciso compartilhar valores, preciso ter o sentimento de pertencer a uma sociedade e ter consciência do outro, preciso ter um sentido de futuro em minha mente.

Porém, estamos no auge do individualismo, não estamos interessados pelo mundo (mundo, leia-se também as pessoas), a não ser no discurso. Pagamos propina para não pagarmos multa, jogamos lixo no chão, se precisar posso até matar para livrar a nossa cara, posso também usar a força e espancar alguém por causa de uma pequena divergência.

Quanto ao pertencimento, não precisamos ir muito longe. Para alguns, a sociedade na forma do Estado só surge para exigir dever (incluí-se punir) e nunca para dividir direitos. Como diz uma música dos Engenheiros do Havaí: “Todos iguais, mais uns mais iguais que outros.”

Existe uma parcela da sociedade que vive sob outros valores, mais brutais. Conhecem só a lei do mais forte. O que queremos de retribuição? Quem diz que não tem nada a ver com isso, pratica o pior dos individualismos, como se o Ser fosse completo e descolado do mundo.

Uma prova de que há outros valores foi uma matéria publicada a dois anos por uma revista de circulação nacional em que uma pesquisadora paulista entrevistou jovens ligados ao crime. A opinião geral deles era que não havia importância no fato de poderem morrer amanhã, tinham o hoje e isso era suficiente. A regra era viver/consumir, ter respeito, liderança nem que seja só por hoje.
Exigir que pessoas assim respeitem a nossa vida, quando sequer respeitam as suas?

Então é preciso estabelecer o valor da vida, do respeito ao outro que começa no respeito a si próprio. O investimento em educação, esporte e arte é uma solução tão óbvia e falada quanto não praticada.

É preciso estimular a sensibilidade, ela torna o mundo melhor. Achar que endurecendo as penas vamos reduzir drasticamente a violência é uma ilusão típica das soluções instantâneas e mágicas que todo mundo faz de bote salva vidas.

Saramago disse que toda vez que está afogado de coisas ruins se agarra a um livro para não afundar na lama. Achar que uns podem fazer uso desse instrumento lúdico para viver e outros não, é achar também que há predestinação à erudição para uns e à badidagem para outros. Ora, se assim fosse não poderíamos culpar os bandidos, pois o critério para a responsabilidade é a liberdade de escolha. Que tal darmos o direito de escolha para poder cobrar com maior veemência pelo dever da responsabilidade?

7.2.07

Outros Pensadores


Eu não sou eu
Nem sou o outro
Sou qualquer coisa de intermédio
Pilar da ponte de tédio
Que vai de mim
Para o outro.
Mário de Sá-Carneiro - Poeta português

19.1.07

Fragmentos


A única coisa imutável no tempo é o passado. Mas sua imutabilidade é fundamental para o futuro. Aquilo que ainda não é, necessita daquilo que é, pois algo só pode vir a ser diante de um ser petrificado. O projeto depende de algo a superar, se não, não é projeto.
Assim, toda mudança só é, em relação a alguma coisa que permanece e tudo aquilo que permanece é chamado de passado.
Já o futuro não surge a partir de um nada, toda existência estabelece um estado relacional, de modo que só há mudança com estabilidade.
Pode parecer contraditório, mas uma das regras da dialética que diz que tudo flui, ou seja, tudo muda, carrega consigo a idéia de estabilidade: há algo de permanente, e é a mudança.
O tempo é uma prova da dialética diante de nossos olhos.
Baseado em Sartre, podemos estabelecer uma “fórmula” para entender o tempo: O ser é o que já não é, e é o que ainda não é.
Vou escrever mais sobre tal assunto, por hora vamos refletir sobre esta “fórmula”.

Dicas


Livro: Ensaio sobre a cegueira escrito por José Saramago.

Não há coisa mais nobre que a possibilidade de ver. Ariano Suassuna nos disse que há uma diferença entre olhar e enxergar.
O português Saramago (ganhador do Nobel de literatura) faz de uma ficção, onde um belo dia se estabelece uma “epidemia de cegueira”, um primor de possibilidades de reflexão sobre o que é enxergar. Por vezes é preciso se distanciar de algo para poder conhecê-lo.
Na obra, perder a visão faz as personagens enxergarem o que estava invisível diante de seus olhos sãos, e o leitor é levado a passar pelo mesmo processo sem ficar cego fisicamente, fazendo-nos abrir os olhos.
Para mim, é uma crítica à alienação contemporânea que faz o homem perder sua humanidade.

18.1.07

Fragmentos


Intervindo no mundo estamos intervindo em nós mesmos. Intervindo em nós mesmos estamos a intervir no mundo.
Somos o produto do todo e o todo também é nosso produto. O ser e o objeto formam um uno. Eles se entrelaçam em uma relação metabólica onde um influencia e determina o outro. O “Ser-puro”, ou melhor, o puro Si-mesmo só existe nas possibilidades da linguagem e não no real.

16.1.07

Dicas


Livro: A cerimônia do adeus, escrito por Simone de Beauvoir.

O referido livro é um relato emocionante dos últimos anos de vida de Jean-Paul Sartre, dividido em capítulos que vai de 1970 a 1980, ano de sua morte. A brochura ainda contém uma excelente entrevista feita por ela a Sartre em agosto/setembro de 1974.
Os dois foram companheiros desde a juventude, onde revolucionaram o conceito de amor conjugal. Eram dois dos principais nomes do existencialismo (corrente filosófica de grande vulto no século XX), além de serem por toda vida militantes de suas idéias e terem se aproximado muito do marxismo.
É realmente uma obra permeada de humanismo capaz de emocionar. No último parágrafo Castor (apelido de Simone muito usado por Sartre) escreve: “Sua morte nos separa. Minha morte não nos reunirá. Assim é: já é belo que nossas vidas tenham podido harmonizar-se por tanto tempo”.

Outros Pensadores


"Somos o que fazemos do que fazem de nós"
Jean-Paul Sartre

Fragmentos


Toda definição é uma tentativa de por fim a algo, é impor limite a uma coisa, é contê-la dentro de uma margem demarcada pela definição que é o próprio conceito.
Quando digo que algo ou alguém é, estou petrificando-o, pondo fim às possibilidades, aprisionando o mesmo ao seu passado, ao seu já-foi e digo que assim é.
Mas isso não passa de uma tentativa, pois o mundo não tem limite. O objeto a ser conceituado nunca deixa se aprionar.
Há sempre as possibilidades, pois tudo está em seu vir-a-ser. Tudo está em direção a seu fim, e enquanto não chega a seu fim particular, não há como estritamente conceitua-lo de forma definitiva.
O mundo não está paradão, está em abertura e se queremos compreendê-lo precisamos nos colocar também em abertura.

14.1.07

Outros Pensadores:


"O que se leva dessa vida é a vida que se leva"
Barão de Itararé

Poema


Liberdade

Todo corpo é gaiola
Caminhar, respirar
Até ir embora.

Todo corpo é gaiola
Espelho é quem diz
Que presença me isola

Todo corpo é gaiola
Cada um diferente
Mas sempre livre por fora.
Severino

Fragmentos

O mundo tole o novo punindo o ridículo.
Os fracos têm medo de parecerem ridículos, preferem a segurança medíocre da normalidade. Temem arriscar, criar e assim contribuem para a mesmice.
Pois tudo que é novo causa espanto, parece loucura, coisa sem fundamento.
Por sua vez, o mundo introjetou a idéia de rejeição à diferença, às novas idéias e é capaz de punir severamente quem insiste em provar que as coisas vão além do que temos por verdadeiro. O mundo é um porvir. Não está, senão que está sendo.
Precisamos viver em constante abertura para o mundo. Os idiotas que morram dentro de suas prisões.